Evangelho do dia (Mt 6,1-6.16-18):
Naquele tempo, disse Jesus aos seus discípulos: 1“Ficai atentos para não praticar a vossa justiça na frente dos homens, só para serdes vistos por eles. Caso contrário, não recebereis a recompensa do vosso Pai que está nos céus.
2Por isso, quando deres esmola, não toques a trombeta diante de ti, como fazem os hipócritas nas sinagogas e nas ruas, para serem elogiados pelos homens. Em verdade vos digo: eles já receberam a sua recompensa. 3Ao contrário, quando deres esmola, que a tua mão esquerda não saiba o que faz a tua mão direita, 4de modo que a tua esmola fique oculta. E o teu Pai, que vê o que está oculto, te dará a recompensa.
5Quando orardes, não sejais como os hipócritas, que gostam de rezar de pé, nas sinagogas e nas esquinas das praças, para serem vistos pelos homens. Em verdade vos digo: eles já receberam a sua recompensa. 6Ao contrário, quando orares, entra no teu quarto, fecha a porta, e reza ao teu Pai que está oculto. E o teu Pai, que vê o que está escondido, te dará a recompensa.
16Quando jejuardes, não fiqueis com o rosto triste como os hipócritas. Eles desfiguram o rosto, para que os homens vejam que estão jejuando. Em verdade vos digo: eles já receberam a sua recompensa. 17Tu, porém, quando jejuares, perfuma a cabeça e lava o rosto, 18para que os homens não vejam que tu estás jejuando, mas somente teu Pai, que está oculto. E o teu Pai, que vê o que está escondido, te dará a recompensa”.
Homilia: Pe. Jaques Rodrigues
Lembra-te de que és pó...
Quarta-feira de Cinzas 2014.
“Cada vez mais me convenço de que esta vida é um constante processo de despojamento de tudo” (Diálogo de As Aventuras de Pi)
“Lembra-te de que és pó, e ao pó voltarás”, ouviremos logo mais ao receber, em nossas cabeças, as cinzas, segundo antiquíssima tradição da Igreja. E qual é o significado desse gesto litúrgico? Será meramente um rito vazio de sentido? Será um ritual mágico que nos previne contra o demônio? Não! É muito mais do que isso; é um gesto concreto que transmite o convite à conversão que o Senhor hoje e continuará repetindo ao longo de toda a Quaresma.
Mas o que é converter-se? Nosso Papa Emérito responde: «Significa procurar Deus, estar com Deus, seguir docilmente os ensinamentos de seu Filho Jesus Cristo; converter-se não é um esforço para autorrealizar a si mesmo, porque o ser humano não é o arquiteto do próprio destino eterno. Não fomos nós que nos fizemos. Por isso, a autorrealização é uma contradição e é também demasiado pouco para nós. Temos um destino mais nobre. Poderíamos dizer que a conversão consiste precisamente em não se considerar “criadores” de si mesmos e assim descobrir a verdade, porque não somos autores de nós próprios. A conversão consiste em aceitar livremente e com amor de depender em tudo de Deus, nosso verdadeiro Criador, de depender do amor. E esta não é uma dependência, mas liberdade» (Homilia, Quarta-feira de Cinzas, 21 de fevereiro de 2007).
Meus caros, ao recebermos as cinzas sobre nossas cabeças damo-nos conta de que somos criaturas limitadas, pecadores sempre necessitados de penitência e de conversão. Em uma época onde cada vez mais se proclama a autonomia do homem em relação ao mundo e a Deus, precisamente quando o homem – por causa disso – se encontra mais sozinho e desolado, o convite à conversão e a dar-se conta de nossa condição limitada é para nós um impulso para voltarmos aos braços de Deus, Pai terno e misericordioso, a termos confiança n’Ele e a confiarmo-nos a Ele como filhos adotivos, regenerados pelo Seu amor.
Assim, a conversão exige que nos ponhamos humildemente na escola de Jesus e sigamos Seus passos, segundo as indicações que Ele mesmo nos vai dando para observarmos ao longo do nosso itinerário de vida. Hoje, no Evangelho, ele nos fala dos três principais instrumentos – “armas”, conforme a oração do dia – para lutarmos contra nosso constante impulso à autonomia em relação a Deus. Cada uma dessas armas, cada um desses instrumentos, reafirma que somos pó, que somos frágeis, que somos necessitados de Deus, abrindo assim espaço em nossa alma para que a graça de Deus aja.
O primeiro instrumento indicado pelo Senhor é o da esmola. São as obras de caridade concretas que realizamos. Dar de algo que temos e somos é um exercício de desapego dos bens deste mundo. O tamanho de nossa generosidade ao praticarmos a caridade é determinado pela fé que temos na Providência. É importante que se diga que ao darmos do que nos sobra, do que não nos fará falta, não praticamos caridade, mas praticamos a justiça: «O pão que para ti sobra é o pão do faminto. A roupa que guardas mofando é a roupa de quem está nu. Os sapatos que não usas são os sapados dos que andam descalços. O dinheiro que escondes é o dinheiro do pobre. As obras de caridade que não praticas são outras tantas injustiças que cometes. Quem acumula mais que o necessário pratica crime» (São Basílio, Comentário a Mateus 25,31-46).
O segundo instrumento indicado pelo Senhor é o jejum. Este «não nasce de motivações de ordem física ou estética, mas brota da exigência que o homem tem de uma purificação interior que o desintoxique da poluição do pecado e do mal; que o eduque para aquelas renúncias saudáveis que o libertam da escravidão do próprio eu; que o torne mais atento e disponível à escuta de Deus e ao serviço dos irmãos» (Bento XVI, Idem). Se não nos exercitarmos em dizer nãos aos prazeres lícitos, renunciando livremente a algo de bom que podemos comer ou tomar, não teremos a fortaleza necessária para renunciar aos prazeres ilícitos que nos frustram como pessoa e nos afastam de Deus e O ofendem.
O terceiro instrumento é a oração. Esta nos ajuda a refletir diariamente na nossa dependência da graça – “Sem mim nada podeis fazer” (Jo 15,5) – e a fazer-nos como crianças que suplicam ao Pai tudo de quanto se tem necessidade, desde o pão nosso de cada dia até a ajuda para nos mantermos libertos do mal enquanto nos encaminhamos para a pátria celeste. A falta de oração é um sinal claro e explícito de uma autonomia – por vezes disfarçada de nós mesmos –, de quem não se julga necessitado de Deus, de quem não tem consciência de sua condição de pó por si mesmo.
Tomarmos as armas da esmola, do jejum e da oração nos ajudará, com certeza, a nos despojarmos de tudo o que nos afasta de Deus, dado que a nossa peregrinação aqui é verdadeiramente um constante processo de despojamento. Que Santa Maria nos ajude a seguirmos estes conselhos de São João Crisóstomo:
«Como no findar do inverno, volta a estação do verão e o navegante arrasta para o mar o navio, o soldado limpa as armas e treina o cavalo para a luta, o agricultor lima a foice, o viandante revigorado prepara-se para as competições; assim também nós, no início deste jejum, quase no regresso de uma primavera espiritual forjamos as armas como os soldados, limamos a foice como os agricultores, e como timoneiros reorganizamos o navio do nosso espírito para enfrentar as ondas das paixões. Como viandantes retomamos a viagem rumo ao céu e como atletas preparamo-nos para a luta com o despojamento de tudo» (Homilias ao povo antioqueno, 3). Que assim seja.

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